segunda-feira, 23 de julho de 2012

O olhar da mente - Oliver Sacks

Depois de ficar cega na casa dos quarenta, Arlene Gordon descobriu que a linguagem e a descrição eram cada vez mais importantes, pois estimulavam sua capacidade de lidar com imagens mentais mais do que antes, e, em certo sentido, permitiam-lhe ver. "Adoro viajar", ela me diz. "Eu vi Veneza quando estive lá". Ela explicou que seus companheiros de viagem descreviam os lugares, e ela então construía uma imagem mental baseada nos detalhes que eles lhe forneciam, em suas leituras e em suas próprias memórias visuais. "Pessoas que veem têm prazer em viajar comigo", ela comentou. "Faço perguntas, e elas então veem coisas que, se não fosse por mim, passariam despercebidas. É tão comum pessoas que têm visão não verem nada! É um processo recíproco - enriquecemos mutuamente os nossos mundos".

Temos aqui um paradoxo - delicioso - que não consigo resolver: se de fato existe uma diferença fundamental entre a vivência e a descrição, entre o conhecimento mediado do mundo, por que então a linguagem é tão poderosa? A linguagem, a mais humana das invenções, pode possibilitar o que, em princípio, não deveria ser possível. Pode permitir a todos nós, inclusive os cegos congênitos, ver com os olhos de outra pessoa.

Trecho do livro "O olhar da mente", de Oliver Sacks, um pouco daquilo em que acredito quando ouço e posteriormente escrevo as histórias dos meus pacientes: a tentativa de olhar para a vida com os olhos de outras pessoas!

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